Gennette e o Estruturalismo
Genette, intrometimento e ciência da literatura e dos aracnídeos.
Ela chegou descabelada e chorando. Madame K. deixava o laboratório de tarântulas devoradoras de macho pós-coito no Instituto de Biologia para vir à Letras me dar a notícia: Genette acaba de morrer. Ela fora aluna do professor em Paris e, constam as fofocas, apaixonadinha por ele. Se rolou algo não sei, acho que não, mas com Madame K. tudo é possível. O choro dela parecia, de fato, choro de viúva. A introdução ao arqui-texto é um dos meus livros de cabeceira, continuou ela tirando os óculos de sol,enxugando as lágrimas e assoando o nariz. É mais importante até que os seus Figuras. O cara sistematizou os gêneros literários, amigo, você que é da área de Letras sabe, né? Não dá para estudar arte literária sem ler o Genette, diz para os teus alunos. Pensei em lhe responder asperamente. Tinha que estudar os aracnídeos e ir lá palpitar no seu laboratório sobre as patas e os pelos daqueles bichos esquisitos que ela tanto ama. Mas me calei. Madame K. quando está depressiva sai de baixo, não vale a pena, ela vira pugilista. Um colega meu da Arquitetura é igualzinho, briguento,metido a machão, a cara e o comportamento dela. E ela não parava. A noção de arqui-textualidade é basilar, meu nego, basilar. Cabe ao leitor e à crítica a responsabilidade na definição dos gêneros. O que o Genette fez, querido, foi o equivalente à classificação dos seres vivos, como a gente estuda no Instituto de Biologia. Te pergunto, meu amigo do peito, processo estético e processo ideológico são indissociáveis, correto? Ia responder, já exausto da disenteria de língua, mas ela cortou, de súbito, o assunto. Tirou os óculos e perguntou: Quem é aquele bonitão ali comendo cachorro-quente?
CRÍTICA DA PROFESSORA VERA DIAS
Toda crítica viva ─ isto é, que empenha a
personalidade do crítico e intervém na
sensibilidade do leitor ─ parte de uma impressão
para chegar a um juízo, [...].
Antonio Candido
Toda crítica viva ─ isto é, que empenha a
personalidade do crítico e intervém na
sensibilidade do leitor ─ parte de uma impressão
para chegar a um juízo, [...].
Antonio Candido
Gérard Gennette e o Estruturalismo
Se não conhecesse meu amigo escritor Godofredo de antemão e sabendo que ele é antes de tudo um ficcionista, queridas alunas, diria que essa Madame K., se fosse personagem da vida real, é muito esperta com seus rompantes e demonstrações de desespero extremos. E aplica bem o velho ditado que diz que casa de ferreiro, o espeto é de pau. Extravasa ao extremo seu desespero pela morte de um filósofo renomado, se descabela toda pra cima do pobre do amigo escritor e, no final, esquece tudo e só tem olhos para o belo Adônis que está a sua frente comendo cachorro-quente. Sua dor, como por encanto, some e sou bem capaz de apostar que se Godofredo continuasse escrevendo essa fábula, ela estaria correndo para o toillette e se ajeitaria toda e ainda pediria para o amigo apresentá-la a esse coitado que se converteria em alvo de seus desejos libidinosos. Não é à toa que ela adore as tarântulas. Sabemos que as fêmeas dessas aranhas devoram os machos após o ato sexual e de fato vocês bem podem imaginar onde a imaginação do nosso querido escritor levaria isso se tivesse que ser fiel aos desejos dessa ninfomaníaca, pra dizer o mínimo. (risos). Casa de ferreiro (ela é uma bióloga e tem fetiche em aranhas tarântulas) mas lá fora age e reage com atitudes bem pouco lógicas e científicas. Sabemos que na vida real tais personagens são passíveis de existirem, afinal a mente humana tem infinitas encruzilhadas e tudo é possível nesse mundo, não é mesmo ?
Porém queridas alunas, a razão do choro delas é bem real. De fato, ontem faleceu esse catedrático catedrático, causa de seus acessos que talvez muitos não conheçam ou tenham
ouvido falar : Gérard Genette. Mas como estudiosa de gêneros literários e como
fiz Faculdade de Letras na UERJ e pós junto, tenho de conhecer quem foi tão
importante figura.
(Noticia
e nota de falecimento no link no final da postagem)
Para começar vcs estudaram comigo na Estácio lá se vão dez e tantos anos atrás duas figuras importantes : Jacques Derrida e Pierre Bordieu que apenas citei mas aprenderam em aulas de filosofia com meus colegas profs de Filosifia, o Profº Alexandre Cabral e o Antonio Augusto de saudosas memórias na UERJ qse estuda ue me lembre. Gennette trabalhou com eles e ambos são citados sempre que se cita a noção de estruturalismo.
Então
vamos espanar o pó , relembrar e começar, Gerárd Genette foi um crítico
literário francês e teórico da literatura que construiu a sua própria abordagem
poética a partir do cerne do estruturalismo . Estruturalismo, vcs sabem : é uma
corrente de pensamento nas ciências humanas que se inspirou no modelo da
linguística e que depreende a realidade social a partir de um conjunto
considerado elementar (ou formal) de relações. Estou explicando assim
mastigadinho pra quem ainda não sabe e estiver lendo isso poder acompanhar a
minha linha de raciocínio.
O termo estruturalismo tem origem
no livro Cours de linguistique générale (em português, Curso
de linguística geral) de Ferdinand de Saussure (1916), que se propunha a
abordar qualquer língua como um sistema no qual cada um dos elementos só pode
ser definido pelas relações de equivalência ou de oposição que mantém com os
demais elementos. Esse conjunto de relações forma a estrutura.
O
estruturalismo é uma abordagem que veio a se tornar um dos métodos mais
extensamente utilizados para analisar a língua, a cultura,
a filosofia da matemática e a sociedade na
segunda metade do século XX. Entretanto, "estruturalismo" não se refere
a uma "escola" claramente definida de autores, embora o trabalho de
Ferdinand de Saussure seja geralmente considerado um ponto de partida. O
estruturalismo é mais bem visto como uma abordagem geral com muitas variações
diferentes. Como em qualquer movimento cultural, as influências e os
desenvolvimentos são complexos.
Pois bem, voltemos ao ponto : ele nasceu em 1930, e juntamente com Roland Barthes, A. J. Greimas, Claude Bremond e Tzvetan Todorov são os críticos mais conhecidos de uma das mais importantes vertentes dessa reflexão teórica literária contemporânea: o estruturalismo, “a maior revolução metodológica nas ciências humanas nos últimos cinquenta anos”, segundo Ivan Teixeira (1998, p. 34).
O principal objetivo da crítica estruturalista era a descoberta de uma gramática “segundo a qual se articulam as narrativas do homem, que não são aleatórias nem imprevisíveis, mas que obedecem a uma estrutura entendida como o conjunto de propriedades essenciais do discurso literário”. Em suma, os críticos estruturalistas empenharam-se em construir “uma teoria da estrutura e do funcionamento do discurso literário” (TEIXEIRA, 1998, p. 35).
Os críticos, que mencionei anteriormente, fizeram parte de uma equipe que, “desde o número 8 da revista Communications, se propôs estudar em termos de descrição estrutural a organização da narrativa, literária ou não” (SEIXO, 1979, p. 10) e o modelo fundador da análise estrutural da narrativa baseou-se na linguística, mais precisamente nos pressupostos teóricos de Ferdinand de Saussure (2000), contidos no Curso de linguística geral, cuja primeira publicação ocorreu em 1916 e que “é com razão considerado a fonte teórica do estruturalismo moderno” (MERQUIOR, 1991, p. 23). Roland Barthes (1972a, p. 24) sintetiza as contribuições e relações da linguística com a análise estrutural nos seguintes termos:
A língua geral da narrativa não é evidentemente mais que um dos idiomas oferecidos à linguística do discurso, e ela se submete em consequência à hipótese homológica: estruturalmente, a narrativa participa da frase, sem jamais ser reduzida a uma soma de frases: a narrativa é uma grande frase, como toda frase constatativa, é de uma certa maneira, o esboço de uma pequena narrativa. Se bem que elas disponham aí de significantes originais (frequentemente muito complexos), encontram-se com efeito na narrativa, aumentados e transformados à sua medida, as principais categorias do verbo: os tempos, os aspectos, os modos, as pessoas; além disso, os próprios ‘sujeitos’ opostos aos predicados verbais não deixam de se submeter ao modelo frásico: a tipologia actancial proposta por A. J. Greimas reencontra na multiplicidade dos personagens da narrativa as funções elementares da análise gramatical. A homologia que se sugere aqui não tem apenas um valor heurístico: implica numa identidade entre a linguagem e a literatura (enquanto esta for uma espécie de veículo privilegiado da narrativa): não é mais possível conceber a literatura como uma arte que se desinteressa de toda relação com a linguagem, já que a usa como um instrumento para exprimir a ideia, a paixão ou a beleza: a linguagem não cessa de acompanhar o discurso estendendo-lhe o espelho de sua própria estrutura.
Os estruturalistas apropriaram-se de conceitos da linguística para estabelecer suas bases teóricas. A narrativa passou a ser uma grande frase na qual se encontram as categorias verbais de tempo, modo e voz. A. J. Greimas propôs-se a analisar os personagens narrativos (actantes) pelo seu modo de agir no relato (sujeito/objeto, objeto/destinatário, adjuvante/oponente). Finalmente, vale lembrar que a literatura usa a linguagem para se exprimir e esta é o objeto de estudo da linguística. Portanto, a linguística forneceu conceitos e princípios básicos para a sustentação da crítica estruturalista.
Gérard Genette (1972a, p. 255), portanto, foi um dos grandes teóricos estruturalistas, que definiu a narrativa como “a representação de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos, reais ou fictícios, por meio da linguagem”, e dedica-se, em seus estudos, à exploração das diversas possibilidades do discurso narrativo.
Ele escreveu livros que é muito citado nos cursos de Letras em estudos linguísticos e no tocante a Gêneros Literários. São os livros "Figuras" (volumes I, II e III).
Além disso, Gennette possuie inúmeros artigos publicados em revistas como Poétique, Littérature etc.
A tarefa que se propôs Genette (POIANA, 1994, p. 23) diz respeito às transformações que se operam somente no nível do discurso. Na sua teoria do discurso, dois são os conceitos fundamentais: figura e estilo, os quais percorrem um caminho único e “terminam um e outro por reintegrar a ordem geral do discurso literário” (POIANA, 1994, p. 34), permitindo verificar a produção, a apreensão e a avaliação da obra literária. Assim, para Genette (1972b, p. 17), a obra “sem dúvida [...] deve, enquanto tal, permanecer como o objeto da crítica”. O que interessa é a obra em particular (o seu discurso) e não a sua gênese, suas fontes ou a biografia do seu autor. Em linhas gerais, procurei aqui dar pra vocês, queridas alunas, uma visão do que é o estruturalismo para a literatura e procurei comentar as ideias e obras de Gérard Genette, um dos seus críticos mais representativos, de forma geral.
Beijos a todas e numa próxima postagem, discorrerei mais sobre isso !
Referências Bibliográficas :
GENETTE, Gérard. Estruturalismo e crítica literária. In: COELHO, Eduardo Prado (seleção e introdução). Estruturalismo: antologia de textos literários. São Paulo: Martins Fontes, s/d, p. 367-392.
_______. Fronteiras da narração. In: BARTHES, Roland et al. Análise estrutural da narrativa. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1972a.
_______. Poétique et histoire. In: _______. Figures III. Paris: Seuil, 1972b. MERQUIOR, José Guilherme. De Praga a Paris. Tradução de Ana Maria de Castro Gibson. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.
POIANA, Peter. Figure et style: concepts esthétiques dans la théorie du discours de Gérard Genette. In.:Littérature. Paris: Larousse, 95: 23-36, 1994.
SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. Tradução de Antonio Chelini et al. 24. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000.
SEIXO, Maria Alzira. A narrativa e o seu discurso. In: GENETTE, Gérard. Discurso da narrativa. Tradução de Fernando Cabral Martins. Lisboa: Arcádia, 1979.
TEIXEIRA, Ivan. Estruturalismo. Cult: Revista Brasileira de Literatura. São Paulo: Lemos Editorial, 15: 34-37, 1998.